domingo, 17 de outubro de 2010

AS MARCAS DAS CHICOTADAS

Havia algum tempo que eu não encontrava trabalho, era sempre assim quando findavam as colheitas no sertão. Isso não acontecia só comigo, mas com uma grande legião de homens que trabalhava na terra.
O dia dos meus dias era longo e quente, tedioso e quase infindável. Nada causava o novo, as mesmas coisas eram iguais e sempre iguais os séculos as tornavam. Tudo se repetia há milhares de milhar de anos.
Os meus antepassados, as quantas primaveras, vinham anunciando “a vinda” de um ser sumamente bom, misericordioso, reto e justo. No entanto, eu sempre achei que tudo não passava de ilusões selenitas; coisas de lunáticos super imaginativos que povoavam suas mentes com alegorias engendradas pelos antigos. Eram estes os meus pensamentos sobre o meu povo.
Ainda pensava nestas coisas, quando Orama, meu companheiro de sofrimento aproximou-se de mim, falou e disse: ouvi dizer ainda a pouco na praça do mercado, que entre nós vive um novo vidente. Dizem que de sua boca sai uma música leve e suave, mas também trovões e relâmpagos; dizem que o som de suas palavras embriaga os doentes e consola os aflitos; dizem ainda, que são palavras novas que nunca foram ditas nem proferidas antes.
Eu nem deixei o meu amigo de sofrimento terminar o seu discurso, logo lhe indaguei: e aonde eu posso encontrar esse novo vidente? Orama, o meu amigo de sofrimento, disse-me, quase sempre no alto de uma montanha, porque Ele gosta de estar sempre perto do Pai.
Fomos ao seu encontro na montanha, porém Ele já havia descido e estava num lugar plano. Avistamos uma grande multidão em sua volta e em seu entorno. Todos queriam muito ouvir as novas palavras, assim como todos desejavam também receber a cura para seus males. Ele já havia começado a falar antes que meu amigo e eu chegássemos. Ainda conseguimos ouvir estes ensinamentos: LUCAS, 6, 22-29. “Mas Eu digo a vocês que me escutam: amem os seus inimigos, e façam o bem aos que odeiam vocês. Deseje o bem aos que os amaldiçoam, e rezem por aqueles que caluniam vocês. Se alguém lhe dá um tapa numa face, ofereça também a outra; se alguém lhe tomar o manto, deixe que leve também a túnica".
Será que somos capazes de aceitarmos estes ensinamentos? Estas coisas meu amigo e eu levamos para as nossas casas. Eu não consegui mais esquecer aquele vidente. O que Ele pedira; o que Ele dissera era impossível alguém como eu aceitar. As suas palavras bateram em mim, como se fossem chicotadas açoitando o meu corpo e machucando meu espírito. O meu amigo de sofrimento enlouquecera, e eu ainda tenho n'alma as marcas das chicotadas.

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