quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

SAUDADE


Saudade não me atormentes,

Preciso viver em paz!

Não te bastas eu perde-la

por quê te fazes audaz?

Com ela trouxeste a dor

Para que em forma de amor

Submetas meu coração.

Por quê tanta selvageria,

Tanta fereza, grosseria,

Maldade e perseguição?


Por quê saudade, por quê

Esse ódio carbonizado?

O que te fiz, qual o mal,

Por esse ranço enraizado?

Tornaste feroz carrasco

No rosto desprezo, asco,

Exibidos na expressão

De tua figura abstrata

Que me condena, maltrata

Só por mísera obsessão.


Vives a punir quem ama

Envilecendo o perdão

E, por seres mal amada

Inventaste a solidão.

Só por inveja e vaidade

Feriste a felicidade,

Matando completamente

A vida que há no amor

Deixando tristeza e dor

Machucando-a plenamente.


Saudade tu te alimentas

D'um sentimento fecundo

Natural da ilha das lágrimas 

Que fica no mar profundo,

Onde, ás vezes, se segrega,

O coração que se entrega

Intensamente encantado.

Por um bem além, distante,

Embora injusto, inconstante,

Mas que se ama deslumbrado.


O quê a saudade seria,

Se não existisse o amor?

Talvez um rude espinheiro

Num deserto abrasador,

Sem dar sombra nem encosto,

As intempéries exposto

Relegado na vastidão

Naquele mundo sozinho,

Nem pouso de passarinho

Comovia-lhe a solidão.


Mário Bento de Morais

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