Aos três filhos da Fazenda Santa Fé:
Marluce, Chico e Marlene
Ás quatro da manhã de
todos os dias a fazenda santa fé, no município de São Mamede – PB despertava
com um aboio suave e solene do vaqueiro para iniciar a celebração do ritual da
ordenha. De repente uma orquestra de chocalhos com acordes frementes e desafinados
tilintava num musical ensurdecedor aos ouvidos refinados, mas angelical e
sublime aos ouvidos rústicos, acostumados à dureza das quebradas do paraíso
chamado sertão. Na porteira do curral a bezerrada agitada esbarrava-se num
frenesi constante, a ansiedade a atormentava e a espera a tornava impaciente
até o grito do vaqueiro: “estreliiinnnha” (era o nome da vaca que ia ser
arreada à ordenha). Mãe e filhote simultaneamente respondiam num mugido como se
algo sensorial as estimulasse e logo se aproximavam da porteira: a mãe para
receber a cria e oferecer-lhe as tetas intumescidas de leite; a cria na
intenção ingênua de banquetear-se com o manjar da vida, o leite sagrado! Num
toque rápido o vaqueiro gira a cravelha da porteira, os gonzos ressequidos e
oxidados pela ação do tempo, soltavam um ringido cansado acompanhado de um
apelo sonoro quase sepulcral para anunciar o fim da tortura humilhante do
chiqueiro! O filhote em alvoroço adentrava no curral e logo se deparava com a
sua mãe e às pressas buscava as tetas. Faminto e atraído pelos eflúvios da
fonte da vida o que lhe causava forte indício de aflição, o bezerrinho tentava
ao máximo tirar proveito desse momento: abanava a calda, batia as patas contra
o chão de estrume, mudava de lado e com movimento alucinado desferia cabeçadas
contra a panela de úberes forçando o apojou. Ali ao lado e de pé, o vaqueiro
pausadamente, começava a prender as pernas da vaca, ou seja, arriá-la: enquanto
isso o lactente se esbaldava nas tetas. Todavia, a experiência do vaqueiro permitia-lhe
cronometrar mentalmente o tempo exato para afastá-lo da mamada – o que logo
acontece. Com o arreador nas mãos, o ordenhador exímio, passava-o em torno do
pescoço do vitelo e o prendia ao corpo da mãe (na altura superior do braço
direito) para proceder à ordenha. Em seguida se assentava sobre um banquinho
tosco de madeira, e num bote certeiro alcançava a calda inquieta da protegida
dos “vedas” e com a vassoura desta limpava as tetas e depois a prendia entre o
arreador e a sua perna. Por último, com uma das mãos tomava o “vaso de leite”
pela asa; colocava-o entre os joelhos curvados, acomodava-o a contento e com as
duas mãos sugava as tetas túmidas do divino liquido. Aos poucos se aproximava o
fim da ordenha daquele dia. O vaqueiro olhava constantemente em direção a uma
casinha de sapê sobre o alto próximo ao curral. Lá estava a sua amada (Severina
Lucena de Morais). A família havia aumentado desde a primavera de 1941, agora
já eram três. Três belas crianças fortes, saudáveis e de uma beleza infinitamente
sertaneja. O vaqueiro ainda pensava nessas coisas quando ouve: pai tem leite?
Era Marluce, Chico e Marlene. Iam tomar leite no curral. Assim começava a
primeira tarefa do dia do vaqueiro – Amaro Bento de Morais.
Muito bom,bem contada com soma de detalhes otimo
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